DE BOAS INTENÇÕES, O INFERNO ESTÁ PAVIMENTADO
O projeto de lei do Estatuto da Igualdade Racial, tramitando no Congresso Nacional, é um desses projetos que, sob o manto de resolver um problema histórico do Brasil, termina por gerar novos conflitos que o país poderia muito bem se poupar. É como se, por uma questão de culpa, devêssemos fazer vista curta sobre falsas soluções propostas.
A desigualdade social é, certamente, um dos grandes problemas nacionais que diferentes governos não têm conseguido equacionar adequadamente. Uma de suas manifestações é uma questão racial que nos é apresentada como se pudesse ser resolvida com critérios propriamente raciais e não sociais. A desigualdade social deveria ser resolvida através da criação de política ativas de igualdade de oportunidades, que criem condições para que os indivíduos possam exercer efetivamente a sua capacidade de livre escolha.
Sob o pretexto de corrigir uma desigualdade social mais acentuada em indivíduos de cor, o Estatuto termina por abolir a mesma igualdade de oportunidades que diz defender ao implementar um critério particular – a cor -, que não concederia aos indivíduos em geral as mesmas oportunidades. O projeto do Estatuto propõe, ainda, para determinar a cor de uma pessoa a auto-classificação. Valeria, então, a declaração de um indivíduo sobre a sua cor, por mais arbitrária que ela possa ser. Uma pessoa de tez morena/branca poderia, por conveniência na obtenção de um emprego ou na alocação de recursos para sua empresa, se declarar decor, criando uma questão inextricável num país profundamente miscigenado.
Imaginem uma controvérsia produzida por um funcionário ou um outro cidadão que, prejudicado, decidisse questionar a declaração. O que se faria? Criar-se-ia uma junta médica que teria a última palavra na determinação da cor de uma pessoa? O perigo político aíembutido é enorme! O mais grave, porém, é que esse projeto de Estatuto está criando um novo MST e uma nova Comissão Pastoral, ou os mesmos com novas funções, além de conferir ao Ministério de Desenvolvimento Agrário e ao Incra novos poderes.
O Estatuto cria uma reserva de terras para remanescentes ou descendentes dos quilombos, que se auto-definiriam enquanto tais. A medição e delimitação das terras seriam feitas pelos próprios interessados, sendo-lhes facultado apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental. É uma outra forma da auto-classificação, ou seja, o arbítrio. Por simples manifestação oral ou escrita ao Incra, se daria início ao processo administrativo.Caberia, então ao Ministério de esenvolvimento Agrário, por intermédio do Incra, dar continuidade ao requerimento, procedendo a todos os trâmites de identificação, delimitação, reconhecimento e desapropriação das terras ou de regularização se já houver pessoas lá vivendo.
O processo seria simples se os descendentes dos quilombos lá estivessem efetivamente, pois seria um mero ato de regularização fundiária. O caso muda de figura se os auto-intitulados remanescentes puderem exercer um "direito" a terras contra proprietários já estabelecidos em virtude de um mero ato de auto-atribuição, equivalente à auto-classificação da cor.
A participação direta dos interessados em todas as fases do processo, inclusive indicando representantes e assistentes técnicos, mostra que o julgamento final já estaria de certa maneira garantido. Invasões de terras teriam agora novas justificativas e amparo legal. Certamente haverá uma recrudescência de conflitos no campo brasileiro, com a "vantagem adicional" de que essas disposições legais passariam a valer também para as áreas urbanas. Campo e cidade seriam objeto de novos e intermináveis conflitos. Por, Denis Lerrer Rosenfield - FSP
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